O II Fórum de Bibliotecas Escolares do Ceará – Forbec realizado no último 29 de novembro, além de reunir nomes que ajudam a construir um caminho melhor para a gestão e importância das bibliotecas escolares, também gestou um manifesto em defesa desses equipamentos que deveria abrigar bibliotecas em vez de serem abrigadas por elas.

O Fórum foi apresentado em três mesas e mais uma plenária de abertura, que contou com a participação da Professora Dra. Marília Paiva da UFMG e presidenta do CRB-6. Em sua fala, destacou que a profissão de bibliotecário deve primeiro partir do reconhecimento da classe, e assim o profissional não pode se deixar abater pela precarização que o mercado de trabalho quer impor a esta profissão. “Imponha o seu conhecimento técnico no local de trabalho, seja numa dentro da biblioteca escolar ou em qualquer outro equipamento. Os gestores acima de você respeitarão sua posição quando perceberam que estão lidando com um profissional gabaritado. Não dá para aceitar ser tratado como um mero guardador de livros”, declarou.

Antes, na primeira mesa do Forbec, Fernando Braga e Kelson Monteiro, presidente e o coordenador de fiscalização do CRB-3, respectivamente, apresentaram números de fiscalização e o andamento deste trabalho, que é a razão de ser dos Conselhos Regionais. Os bibliotecários também apresentaram os próximos passos da gestão, como a criação de um mapa que será hospedado no site do Conselho para que a sociedade acompanhe as fiscalizações.

A Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba (PPGCI – UFPB), Laiana Ferreira de Sousa, levou toda a sua experiência da academia para discorrer sobre a criação e a implantação de um sistema de bibliotecas que funcione. Segundo ela, o interesse do poder público é essencial nesta decisão. Em sua fala, a palestrante ressaltou a importância da valorização da categoria e da unificação da base a fim de cobrar políticas públicas que legitimem o exercício legal da profissão, e ainda questionou a ausência do poder público nesse processo de construção de uma rede de bibliotecas escolares municipal equipada e como espaço de fruição de ideias, aprendizados e informação.

Laiana participou da mesa Discutindo a criação de um sistema de bibliotecas escolares municipal”, em que a Secretária Municipal de Educação de Fortaleza (SME) e a Secretaria da Educação do Estado (SEDUC) também foram convidas, porém não enviaram representantes e muito menos responderam ao ofício do convite.

A última mesa do II Forbec trouxe exemplos práticos e emocionantes de Inovação e Boas Práticas na Biblioteca Escolar. As bibliotecárias Talita Firmeza e Raissa Mohana Freitas, além da pedagoga Aline Saraiva levaram suas vivências nos equipamentos, mediadas pelo Conselheiro Júlio Duarte. Um momento riquíssimo de troca de experiências.

O Manifesto em prol das Bibliotecas Escolares do Estado do Ceará, mencionada no início deste texto, tem a autoria do Conselheiro Felipe Alves e do Professor Dr. Tadeu Feitosa do Departamento da Ciência da Informação da UFC. O documento foi apresentou, e após sua leitura foi assinado pelos presentes. Confira abaixo:

Manifesto em prol das Bibliotecas Escolares do Estado do Ceará 

O Conselho Regional de Biblioteconomia – 3ª Região – Ceará e Piauí (CRB-3) e o Departamento de Ciências da Informação, da Universidade Federal do Ceará – DCINF/UFC – unem-se sob a égide do II Fórum de Bibliotecas Escolares do Ceará de 2019,  Forbec – para reafirmarem a importância das bibliotecas escolares e unirem suas vozes e suas forças para enfatizar a missão dessas instituições na formação educacional, cultural e humanística das comunidades escolares, de seus entornos e da contrapartida inalienável da presença de profissionais bibliotecários a frente de suas ações e gestões.

No momento em que o Brasil passa por indisfarçáveis ações governamentais contra direitos adquiridos, aviltando garantias e liberdades conseguidas, dificultando ações e projetos nos âmbitos diversos da educação e da cultura, pensar em bibliotecas escolares é salvaguardar a missão indelével dessas instituições na formação educacional, cultural e humana de estudantes, professores e das comunidades nas quais a biblioteca se insere. De modo igual, pensar nessas bibliotecas e na grandeza de seus serviços é garantir a elas a presença do bibliotecário – bacharel em Biblioteconomia.

Ainda que a Lei Nº. 12.244, de 24 de maio de 2010, já no seu Artigo 1º garanta bibliotecas escolares em instituições de ensino públicas e privadas e elas não existam de fato em todas as instituições, fica patente na forma da lei a obrigatoriedade de, existindo bibliotecas, seja garantido a sua gestão por um profissional bibliotecário formado para isso.

A Lei também explicita a relação da biblioteca escolar e um acervo pertinente à realidade da escola. Fica claro nas entrelinhas da lei o valor que ela dá à comunidade escolar; a defesa das suas características culturais; os universos e contextos culturais de seus entornos e as expectativas educacionais e culturais dessa comunidade escolar. Comunidade que, mediada pelo profissional bibliotecário, garantirá o atendimento às suas demandas, a garantia de seus acervos e serviços, a garantia de seus protagonismos socioculturais e educacionais.

Às vésperas de completar dez anos, a referida lei ainda permanece obscura quanto aos cumprimentos que se arrastam silentes e inoperantes no devir de sua real implementação. O seu Artigo 3º não apenas explicita a obrigação de o País e seus sistemas de ensino desenvolverem “esforços progressivos” para a universalização das bibliotecas escolares num prazo de dez anos, como sentencia a obrigatoriedade de essas instituições contarem com profissionais bibliotecários, disciplinados pelas Leis Nº 4.084, de 30 de junho de 1962, e a Nº 9.674, de 25 de junho de 1998.

Vale ressaltar que a presença profissional de bibliotecários à frente das gestões de bibliotecas escolares dá a eles as devidas qualificações para deliberarem, nos termos da profissão, que é ele que entende da gestão desses espaços, dessas demandas, serviços e acervos, além das práticas de pesquisa e de leitura na biblioteca escolar e outras atividades artísticas e culturais que não dependem dos disciplinamentos pedagógicos, mas com eles dialogam, com o fito de atuarem onde as escolas não atuam porquanto Escola e Biblioteca, mesmo sendo co-irmãs, têm aspectos diferentes que precisam ser levados em conta.

As leis deixam claro que, para além das especificidades filosóficas de cada profissão, das diferentes demandas de natureza socioeducacional e dos desdobramentos de ações culturais próprias das bibliotecas escolares, com suas complexas e plurais ações de leitura e práticas leitoras dentro e fora delas, há que se levar em conta, sob a rubrica da lei, a profissão de bibliotecário e suas responsabilidades para com todas e quaisquer bibliotecas. Não por acaso, desde a década de 60 a Lei Nº 4.084, de 30 de junho de 1962, garante a profissão de bibliotecário. Por meio dela, disciplina e garante o “Exercício da Profissão de Bibliotecário e das suas Atribuições”.

Sob o estatuto desta lei, já em seu Artigo 1º pode-se ler: “a designação profissional de Bibliotecário, a que se refere o quadro das profissões liberais, grupo 19, anexo ao Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 (Consolidação das Leis do Trabalho), é privativa dos bacharéis em Biblioteconomia, de conformidade com as leis em vigor”.

Assim, sem a necessidade de quaisquer argumentos em contrário, não cabe aos poderes públicos ligados a outros campos do conhecimento e de ações profissionais arbitrarem sobre demandas profissionais em bibliotecas, que não sejam as disciplinadas por esta lei e outras acima citadas e sentenciadas pelo Art. 3º desta mesma lei, que aponta a obrigatoriedade do “diploma de Bacharel em Biblioteconomia, respeitados os direitos dos atuais ocupantes”.

Para além das pertinentes e diversas atuações técnicas do fazer bibliotecário, que só podem ser exercidas por profissional bacharelado devidamente registrado em seu Conselho Regional, temos, nas bibliotecas de todo tipo e, mais especificamente nas bibliotecas escolares, “o planejamento de difusão cultural, na parte que se refere a serviços de bibliotecas”, observadas as especificidades de cada unidade de informação e as demandas de suas comunidades e de seus usuários.

A mesma Lei disciplina o papel dos Conselhos de Biblioteconomia. Assim, segundo o Artigo 8º, “a fiscalização do exercício da Profissão do Bibliotecário será exercida pelo Conselho Federal de Biblioteconomia e pelos Conselhos Regionais de Biblioteconomia, criados por esta lei”.

Fica explícito na Lei Nº 4.084, de 30 de junho de 1962, o papel mediador desses conselhos e a defesa deles das demandas dos profissionais bibliotecários, dos cumprimentos das leis e dos diálogos que devem ser feitos com outras profissões, como sempre tem sido feito. Nesse sentido, deve-se observar o seu Parágrafo único, para o qual, “as questões referentes às atividades afins com as de outras profissões serão resolvidas através de entendimentos com as entidades reguladoras dessas profissões”. Ditos entendimentos não podem e não devem ser prescindidos do rigor da lei sobre a presença inalienável do profissional bibliotecários em quaisquer bibliotecas dos setores municipais, estaduais, federais, autárquica, paraestatal, nas empresas de economia mista ou nas concessionárias de serviços públicos presentes no Artigo Terceiro desta lei.

Os cenários atuais, às vésperas do final do prazo de dez anos dados pela Lei Nº. 12.244, de 24 de maio de 2010, são preocupantes, o que exige de nós posturas mais contundentes sobre a negligência do Estado para com o cumprimento da lei e da garantia de que bibliotecas escolares e outras de outros gêneros tenham em suas unidades de informação e educação profissionais bibliotecários.

Dados atuais mostram que a Secretaria Municipal de Educação tem 293 (duzentas e noventa e três) Escolas e, de acordo com a resolução do Conselho Federal de Biblioteconomia (CFB 199/2019), que dispõe  sobre os parâmetros a serem adotados para a estruturação e o funcionamento das Bibliotecas Escolares e define em seu Art. 2°, inciso IV-Pessoal: Presença obrigatória de um bibliotecário  supervisor, responsável por um grupo de no máximo quatro bibliotecas; deveria ter, no mínimo, setenta e quatro Bibliotecários.

Em dados obtidos na Secretaria de Educação do Ceará – SEDUC, setecentos e vinte e oito escolas contam com bibliotecas. De acordo com a mesma resolução do CFB, deveria ter, no mínimo, 182 (cento e oitenta e dois) Bibliotecários.

Destas, 252(duzentas e cinquenta e duas) são de Tempo Integral, de acordo com a resolução do CFB 199/2019, deveria ter, no mínimo, 63 (sessenta e três) Bibliotecários e 122(cento e vinte e duas) Escolas Profissionalizantes, de acordo com a resolução do CFB 199/2019, deveria ter, no mínimo, 42(quarenta e dois) Bibliotecários. O que reivindicamos?

Assim, esperava-se da SEDUC a contratação imediata de cento e oitenta e dois bibliotecários por meio do Plano Dinheiro Dentro da Escola – PDDE – e um Planejamento para até 2020 de um concurso com esse quantitativo. Isso representa cerca de 16% de um concurso que o Estado faz para Professores.

Para a Secretaria Municipal de Educação de Fortaleza, reivindica-se a contratação via concurso público, programado para ser realizado até o final do ano de 2020, de sessenta e cinco bibliotecários para suprir a demanda mínima da rede municipal, que chega a quase 300 escolas.

Como se percebe, as leis em lide vêm sendo negligenciadas pelos poderes públicos e a importância das mediações educacionais, artísticas e socioculturais das bibliotecas escolares não podem continuar convivendo com tais desmandos. Assim, esse manifesto reivindica a reabertura dos diálogos dos entes estaduais e municipais com este CRB para os ajustes jurídicos e legais dessas deficiências de profissionais bibliotecários nas bibliotecas escolares do Estado do Ceará e do Município de Fortaleza. De modo igual, a abertura de diálogo com o Departamento de Ciências da Informação, da Universidade Federal do Ceará, responsável pelas pesquisas, pelo ensino de graduação e pós-graduação, pelas ações de extensão para a formação profissionais bibliotecários cujas ações profissionais estejam em consonância com o que pedem as demandas internacionais, nacionais, regionais e locais do fazer bibliotecários nas escolas e nos seus entornos.