O artigo do ensaísta Davi Lago para o blog nesta semana
Por Davi Lago
O Dia do Leitor é comemorado no Brasil em 7 de janeiro. A 4ª edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil desenvolvida pelo Instituto Pró-Livro considera “leitor” aquele que leu pelo menos um livro nos últimos três meses – inteiro ou em partes. Os dados de 2016 revelam que o brasileiro lê em média 2,43 livros por ano. O baixo índice de leitura é uma de nossas mazelas históricas e aponta para o empobrecimento dos debates brasileiros. Por óbvio, o repertório amplo de leituras contribui para o amadurecimento do espírito crítico do cidadão. O que é a realidade senão a leitura que fazemos dela?
Conforme a pesquisa, entre as principais motivações que impulsionam os leitores brasileiros estão: o gosto pela leitura (25%), atualização cultural (19%), distração (15%), motivos religiosos (11%), crescimento pessoal (10%), exigência escolar (7%) e atualização profissional ou exigência do trabalho (7%). Todas essas motivações integram o papel civilizador da leitura. Já a primeira razão apresentada pelos leitores como obstáculo para o aumento da leitura é a falta de tempo (43%).
De fato, ler não é tão simples. Ler não é uma atividade passiva, estática, mas dinâmica. Do mesmo modo que uma biblioteca não é um mero depósito silencioso de livros. Na leitura há o cruzamento de dois mundos e a possibilidade de se perceber as coisas através de outro ponto de vista. Um livro é um mundo: o mundo de leituras de seu autor dialogando com o mundo do leitor. Por isso, a leitura nunca será igual para dois leitores. Este processo é, sobretudo, civilizador. Como afirmou Mario Vargas Llosa ao receber o prêmio Nobel de Literatura em 2010: “um mundo sem literatura se transformaria num mundo sem desejos, sem ideais, sem desobediência, um mundo de autômatos privados daquilo que torna humano um ser humano: a capacidade de sair de si mesmo e de se transformar em outro, em outros, modelados pela argila dos nossos sonhos”.
Sem dúvida, o Brasil avançou muito nos últimos trinta anos em termos de cidadania. A garantia dos direitos do cidadão foi uma preocupação central na elaboração da Constituição Federal de 1988. Nossa Carta Magna eliminou, por exemplo, um grande obstáculo à universalidade do voto, tornando-o facultativo aos analfabetos. Também conseguimos reduzir os números do analfabetismo: em 1991 a taxa de brasileiros com mais de 15 anos de idade analfabetos era de 19,7%, número reduzido para 7,2% em 2017 conforme dados do IBGE. Trinta anos depois da promulgação da Constituição temos muitos eleitores, mas ainda carecemos de leitores. Ler é viver e conviver, é um esforço em compreender o outro. Com mais leitura a sociedade brasileira tecerá sua multiplicidade mais civilizadamente. Feliz ano novo e boas leituras!
* Davi Lago é escritor, mestre em Filosofia do Direito e ativista humanitário. Colabora com o blog com textos sobre marcos civilizatórios e sociedade contemporânea.
Fonte: G1